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domingo, 19 de setembro de 2010

O peso do calor da tarde caía sobre seus olhos cansados, caía sobre seu corpo estático. Pensava apenas em fugir dali, mas sem sair, sem se mexer. Não queria sair de seu lugar, queria que as pessoas ficassem longe, se desmaterializassem de sua mente e de seu cotidiano, queria que elas se mexessem. Tinha sede de viver em outras mínguas, às vezes em cidades acordadas, às vezes em ruas adormecidas. Já tinha quase o bastante para poder sorrir aos ventos, ou poder respirar, suspirar como quem cheira qualquer margarida, alecrim. Como alguém que entrasse em uma pequena casa de madeira e escutasse qualquer música que estivesse no compasso de seus pés, de sua dança, de seus humores.

Tocava com suas mãos silenciosas, os frutos do verão, as rosas de primaveras ou a água de chuvas passadas, o orvalho. Seu universo tinha uma textura original, tinha diferentes cores, respirações, aspirações de diversos tipos. Não compreendia seu próprio sol, sua própria dança a qual ainda tinha a esperança de dominar.

Mouni Dadoun.

sábado, 4 de setembro de 2010

Reconforto-me em sonhos perdidos, passados, nostálgicos. Perco-me ,talvez , em meu egoísmo com uma leveza despercebida, descontrolada. Perco-me em homens supérfluos, olhos desgastados e linguagens codificadas, abstratas e difíceis de serem retratadas. Vejo-me em um filme qualquer, em nomes de livros, personagens e vidas. Vejo-me em discussões sem sentido algum e que mesmo assim, tento e continuo defender o meu ideal, o meu pensamento, mesmo que utópico.

Jogo-me em sujas sarjetas e velhas ruas. Tempos depois percebo o que bebi ,o que usei, o que senti. Observo movimentos em uma velocidade lenta, capaz de me mostrar o real em outras linhagens e dimensões. Começo a caminhar então por um estreito enredo, uma dramática ou irônica narrativa, começo a viver.
Não pense que isso seja perder tempo. Esse espaço é necessário, é dado por nós mesmos e deve ser aproveitado como experiência , como aprendizado para formamos ideais, opiniões, para
nos formarmos como seres humanos, ainda que hoje essa espécie esteja em extinção.

Mouni Dadoun.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

O que trago no peito é nostálgico, saudável.
Tem compasso, tem calor e aroma.
O que trago no peito são flores de todos os tipos, céus de todas as cores.
O que tenho comigo sempre está banhado de sol, de brilho.
Tem tom de roupa ao sol, de verde claro e vermelho de roseirais.

Trilhas sonoras, em ruas floridas, fonte inesgotável de vida.
Tulipas em asfaltos, escadas de cachoeiras.
Orvalho em folha de manjericão, cor de esmeralda.
Semente caída na terra, jogada ao vento, semeada pelo sol.

Contigo partilho a dor do partir, a dor de ser.
Partilho a dor do saber e me perco em nostalgias negras.
Caio em sonhos clareados por sua ternura e beleza,
Trago-lhe no peito, em som, em luz , em beleza e dor.

Mouni Dadoun.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Nem todos os livros da Babilônia destruída fariam do homem, sábio por inteiro. O esclarecimento vital vem do amor consumido, do ódio liberado, do brilho do olho, do prazer da labuta. Vem não só de escritos sagrados, mas vem dos observatórios freqüentados, da experiência em si e das anotações na mente. Na memória emocional ou no traço da vida. Mesmo os que não possuem veia poética ou cultura armazenada, podem esclarecer simples dúvidas dos mais barbudos que vivem em cavernas, solitariamente.

Os boêmios de olhos grandes e escuros, cobertos por sobretudos e enrolados em cachecóis ,perambulam por ruas úmidas e frias , e dão à luz poemas e prosas sedimentados a partir da cana, da fada verde do barulho da brasa que consome o tabaco. Os amaldiçoados como Rimbaud se escondiam em pontes e caminhavam contra os rumores dos dramas de revoluções sociais, de nações que se preocupavam apenas em adquirirem impostos e terras.

Cortiços incendiados davam lugar a enormes prédios que mudavam seu físico a partir de revoluções culturais. Abrigavam o repúdio ao menor, ao subúrbio e financiavam o superficial do lucro. Os poemas e prosas, bêbados e contraditoriamente sóbrios foram deixados para trás pelos ditatoriais governos disfarçados com uma falsa democracia.

Mouni Dadoun.